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Diário de um VC — As Leis Universais do Crescimento

Do ponto de vista biológico, o crescimento nada mais é do que uma das etapas do ciclo da vida: nascemos, crescemos e morremos. Alguns animais, como os mamíferos, têm crescimento determinado, ou seja, o crescimento cessa em um certo estágio da vida, e o organismo passa a degradar até a morte. Outros, como os peixes, tem crescimento indeterminado: eles crescem até o fim de suas vidas.
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Diário de um VC — As Leis Universais do Crescimento
Diário de um VC — As Leis Universais do Crescimento

Photo by Giulia May on Unsplash

O ciclo da vida

Do ponto de vista biológico, o crescimento nada mais é do que uma das etapas do ciclo da vida: nascemos, crescemos e morremos. Alguns animais, como os mamíferos, têm crescimento determinado, ou seja, o crescimento cessa em um certo estágio da vida, e o organismo passa a degradar até a morte. Outros, como os peixes, tem crescimento indeterminado: eles crescem até o fim de suas vidas.

Mas a partir da constatação de que esse ciclo é inevitável, duas questões têm rondado a humanidade desde os início dos tempos: i) qual o tamanho máximo de crescimento de um organismo e ii) qual o tempo máximo de vida desse organismo.

Galileo Galilei foi o primeiro cientista a responder satisfatoriamente a primeira pergunta. Conjecturando o que aconteceria se tentássemos escalar infinitamente um animal, uma árvore ou até mesmo um prédio, ele descobriu que existem claros limites à escala de qualquer organismo dada a sua forma e composição: enquanto o peso (volume) escala ao cubo das dimensões lineares, a força (pilares) cresce apenas ao quadrado. Ou seja, o organismo colapsa com o seu próprio peso. Em outras palavras, o tamanho máximo de um organismo é dado ao nascimento. Ao menos que a sua forma ou composição seja modificada.

Inúmeras descobertas científicas ao longo das últimas décadas vieram responder a segunda pergunta. Existe sim um tempo máximo de vida para cada organismo, dado o seu tamanho máximo: quanto maior o animal mais longo é o seu amadurecimento e mais tempo ele vive; quanto menor o organismo menos tempo ele vive. Isso porque o número total de batimentos cardíacos ao longo da vida é aproximadamente igual para todos os mamíferos: quanto menor o animal, mais rápido são os batimentos cardíacos; quanto maior o animal, mais lento são os seus batimentos.

A existência dessas constantes, demonstram que o processo de crescer e morrer não é arbitrário e sugere a existência de princípios que regem esse processo para todos os tipos de organismos. Mas quais são esses princípios e que paralelos poderiam ser traçados para entender as questões que consomem todos empreendedores e investidores: Qual potencial de crescimento de uma startup? O quão rápido é possível crescer? Quanto custa crescer? Por quanto tempo é possível crescer? O que é crescer sustentavelmente?

Em “Scale: The Universal Laws of Growth, Innovation, Sustainability, and the Pace of Life in Organisms, Cities, Economies, and Companies”, Geoffrey West aborda como toda forma de vida é resultado i) da busca incessante por alimentos, ii) da metabolização desses combustíveis em energia, iii) da distribuição dessa energia através de redes de transporte para construir e manter as células e iv) da inevitável entropia que desgasta física e quimicamente o organismo.

Os princípios do crescimento

Todos os organismos são máquinas gananciosas por fontes de energia. Esse desejo por mais e mais fez com que a evolução favorecesse as espécies com uma maior habilidade de captura de energia. Não é à toa que as maiores áreas de uma árvore são a sua copa e raiz, justamente as unidades responsáveis por captura e troca de energia com o meio ambiente. Os organismos buscam conquistar o máximo possível de espaço na busca inesgotável por alimento, até serem cerceadas por competidores. Isso explica o porquê a maior parte do tempo, recursos e talentos de uma scaleup tem de ser dedicados a vendas, atendimento e fundraising.

Uma vez capturado o combustível, os organismos se desenvolvem no aprimoramento da sua habilidade de conversão desses combustíveis em energia, já que a velocidade do metabolismo influencia a quantidade de nutrientes que o organismo necessita buscar. Quanto mais eficiente é esse processo, mais rápido o organismo cresce e maior é o seu tamanho máximo potencial. Não é à toa que o aprimoramento da taxa metabólica, que é soma de todos processos químicos no organismo que produz energia para as células, é um enorme fator de vantagem competitiva biológica. A taxa metabólica atual do Homem é 100x maior do que aquela quando éramos nômades. Podemos comparar a taxa metabólica à capacidade do produto de uma empresa gerar margem bruta, e em algum momento da sua vida, lucro e fluxo de caixa positivo. O equivalente do metabolismo para uma scaleup é a eficiência da sua unidade de crescimento: quanta margem bruta (produto) gerado dado os recursos de marketing, vendas e customer success utilizados no processo.

Mas para que o alimento seja capturado e depois de metabolizado em energia ser transportado por todo o organismo, são necessárias redes de transportes (sistemas circulatório, respiratório, renal, neural e vascular). Essas redes são o grande limitante de todo o processo fisiológico. É a configuração dessas redes de transportes que limitam o tamanho máximo e o crescimento de qualquer organismo. A maior parte das redes biológicas são compostas de fractais — objetos geométricos que podem ser dividido em partes, cada uma das quais semelhante ao objeto original. Esse tipo de pecinha de Lego, está presente em toda a natureza, e é utilizado por quase todos organismos para construir as suas redes, buscando sempre maximizar a entrega de energia para todas as células, no menor tempo e com o menor custo energético possível. É impossível não parar para notar que uma aorta humana e um tronco de árvore se desenvolvem exatamente do mesmo jeito. O equivalente aos fractais no mundo das scaleups são os pods de vendas/atendimento (revenue ops), os squads de produto e as unidades de gestão de talentos;, que encapsulam as redes de captura e de distribuição de informação, cultura e remuneração de uma empresa.

Mas infelizmente existe um preço a ser pago sempre que a energia é processada e transportada: a entropia. Sempre que energia é transformada em uma forma útil, algo inútil também é criado como subproduto. Existe um desgaste físico natural do fluxo das redes de distribuição que quanto mais o organismo cresce, mais exige manutenção; e esta fica cada vez mais cara e difícil, até o ponto em que ela começa a se tornar insustentável. É impossível a vida sem lixo (coisas inúteis, feias, sujas, erradas, tortas, etc), mas existem estruturas de crescimento que as minimizam, permitindo assim a vida continuar. Crescer dói, mas crescer muito rápido sem preparo mata. A entropia das scaleups está na falta de foco, na falta de uma cultura construtiva, no crescimento desorganizado, e em todos os tipos de dívidas (technical debt, organizational debt, infrastructure debt: ou seja, tudo aquilo que devemos fazer mas vamos deixando para um futuro que nunca chega).

Crescimento Exponencial

Embora a natureza imponha limites ao tamanho máximo dos organismos e o seu tempo de vida; o homem conseguiu criar sistemas que superam esses limites através das interações sociais: quanto maior a conectividade entre as pessoas em uma comunidade, maior é a atividade socioeconômica e maior é o desenvolvimento. Essas interações deram o ensejo para o que hoje chamamos de crescimento exponencial: a multiplicação contínua das interações, conhecimento e geração de riqueza.

Medido pelo tempo que um sistema leva para dobrar de tamanho (dia, semana, mês, ano), o crescimento exponencial, seja do tamanho de uma cidade, riqueza dos indivíduos, popularidade das pessoas, é um tipo de evento raro que não pode ser entendido pela distribuição clássica da Curva de Gauss, mas sim pelos princípios da Regra de Pareto, que estipula, por exemplo, 80% do “sucesso” disponível em uma classe de escola é distribuída apenas em 20% dos alunos. Além de sofrerem esse efeito concentrador, os sistemas que crescem exponencialmente, apresentam ainda uma característica estatística conhecida como vantagem cumulativa (os ricos ficam cada vez mais ricos), ou seja, não só poucos alunos ficam famosos na sala de aula, mas apenas 1 ou 2 pessoas ficam cada vez mais famosos que os outros, atraindo quase que a totalidade das atenções.

A questão que fica para as scaleups que não apenas querem crescer rápido, mas sim crescer exponencialmente, é como se tornar esse 1% de casos de “sucesso”.

Em uma palestra inusitada no Museu de História Natural em NY, o escritor e arqueologista Jared Diamond, autor de livros como "Armas, Aço e Germes"; explica em How To Get Rich (leia, você não vai se arrepender!) que as sociedades que mais se desenvolveram ao longo da história da humanidade conseguiam atingir o máximo de produtividade, aprendizado e cooperação entre os seus membros balanceando dois fatores:

  • Exposição ideal a competidores: sociedades isoladas não progridem, já que novas ideias vem do mundo externo; sociedades que vivem em ambientes extremamente competitivos não tem tempo nem energia para se aprimorar. Esse papel cabe ao time de liderança que está continuamente buscando as melhores práticas globais de produto, vendas, operações, talento e modelo de negócio;
  • Divisão ideal das unidades de produção: existe um tamanho ideal dos grupos de trabalho; saber balancear o tamanho ideal dos times e das unidades de negócio são um imperativo para garantir o funcionamento sociológico de um número cada vez maior de pessoas na organização. Essa é uma tarefa cada vez mais empregada pelas equipes de People Ops nas empresas que mais crescem.

Para superar os limites de tamanho e crescimento que a estrutura das espécies permitiam, os sistemas biológicos e as sociedades adotaram processos adaptativos, que permitissem a mudança da estrutura ou materiais do organismo. É por isso que os organismos “inovam”, ou sejam, buscam novas maneiras de poder crescer cada vez mais e serem cada vez mais eficiente. Ao longo da evolução das espécies, a seleção natural vem favorecendo aqueles organismos que otimizam cada uma dessas quatro atividades com um fim apenas: crescer com eficiência. E porque crescer com eficiência? Simplesmente porque o metabolismo e a distribuição de energia geram economias de escala: quanto mais eficiente é o organismo, menos energia ele precisa.

Edson Rigonatti

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Edson Rigonatti

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