“What is the most resilient parasite? Bacteria? A virus? An intestinal worm? No..It’s an idea. Resilient… highly contagious. Once an idea has taken hold of the brain it’s almost impossible to eradicate. An idea that is fully formed — fully understood — that sticks; right in there somewhere.” Cobb (Leonardo diCaprio — A Origem)
Se “O Lobo de Wall Street” é a ode à máquina de vendas, “A Origem” é o pilar da máquina de produto. Nele, Leonardo DiCaprio faz tudo aquilo que todo gerente de produto sonha em fazer: entrar nos sonhos de seus clientes e roubar todos os seus segredos, para assim desenvolver o produto perfeito.
E o sonho de todo investidor é achar o produto perfeito. Afinal toda grande empresa começa com um grande produto. Mas nem todo grande produto resulta em uma grande empresa. Construir uma grande empresa requer dominar uma série de engrenagens (máquinas), cada uma mais difícil que a outra. Morgan Housel do Collaborative Fund chama esse conjunto de Hierarquia do Lucro:
Mas para chegarmos lá, precisamos começar com o produto perfeito. E afinal de contas, o que é um grande produto?
O produto perfeito
Existem inúmeras definições sobre quais são os componentes de um killer product. Mas para nós, um grande produto tem 5 características:
- Proposta de valor clara e percebida: um produto animal tem um posicionamento animal — ele encaixa direitinho na cabeça das pessoas, que entendem imediatamente o que é, como funciona, quanto vale aquilo que está diante dela. Isso é fruto do conhecimento profundo de como funciona a cabeça do consumidor, quais são as referências existentes lá dentro. Isso se reflete no design do produto, nas imagens associadas a ele, ao texto que o descreve. Um posicionamento animal não é apenas o ponto de partida de grandes produtos, mas das melhores máquinas de vendas e das melhores culturas corporativas. O posicionamento diz a todo mundo qual o foco, a direção e o propósito. Ë possível contratar uma agência para ajudar com o posicionamento? Sim. Mas o posicionamento é resultado de muito sangue, suor e lágrimas dos fundadores; seja porque eles tem 10 mil horas de experiência com a dor do cliente ou porque eles são arqueologistas que não desistem de buscar o que está enterrado lá dentro. Para começar, leia Positioning do Al Ries e o que puder da April Dunford e contrate uma agência ou pessoa com experiência em roteiro/storytelling para te ajudar;
- Gostoso de usar: design é a profissão do futuro. Em breve, provavelmente uma função tão ou mais importante que o technical co-founder e uma das únicas técnicas capazes de criar uma vantagem competitiva. Todo produto gostoso de usar tem um designer por trás — alguém que entenda profundamente de comportamento humano e como os 5 sentidos interagem quando estamos usando um produto. Sabe a diferença entre uma porta fácil de abrir e aquela que você não sabe por onde começar? Ou aquele iconograma esdrúxulo na porta do banheiro que você nunca sabe se é homem ou mulher? Essa é a diferença entre um produto gostoso de usar e um que…bom…você entendeu. A lista de recomendações é longa (10.000 horas!), mas você pode começar com o Don Norman;
- Indispensável: um produto incrível resolve um problema importante, não tem substitutos à altura (seja no nível funcional, emocional ou social) e tem que ser usado frequentemente (a tal da pasta de dente). É fácil saber quando um produto é indispensável: tire a chupeta da criança e veja o que acontece. Para construir algo indispensável, você precisa descobrir ou se tornar um hábito. Você pode começar com o Hooked do Nir Eyal ou mergulhando nos conceitos de Behavior Design.
- Faz a minha vida melhor: o produto perfeito tem um retorno sobre o investimento (ROI) inquestionável — eu gasto menos tempo da minha vida lidando com o problema, eu economizo dinheiro em relação a outras alternativas, eu consigo fazer muito mais do que eu fazia antes. Seja um produto para o consumidor, um serviço para empresas ou uma plataforma, todo cliente quer uma vida melhor (ROI). Um bom gerente de produto sabe elencar quais são as alavancas de valor do seu cliente, sabe priorizar funcionalidades que vão impactar o ROI e sabre provar esse retorno;
- Não me deixa na mão: grandes produtos são a combinação de engenharia de primeiríssima qualidade (não falha) e um carinho e respeito absurdo pelo cliente — se falha o produto é arrumado ou consertado com a mínima fricção, ou até mesmo imediatamente trocado. Essa é uma característica que emana diretamente de um déspota esclarecido — o founder/CEO que é Unusually Excellent.
Como eu sei se é um produto perfeito?
Alguns dizem que o produto perfeito é como o amor: eu sei quando eu vejo…só que não. É sim possível tocar (métricas) e ver (arquitetura) o produto perfeito.
Para tocar, basta olharmos a evolução de 5 métricas-chave de grandes produtos: i) o alcance, ou quantas pessoas usam o produto, ii) a profundidade — é pasta de dente?, iii) tempo que passa usando, iv) eficiência — o produto funciona? e v) as pessoas recomendam o produto? Quanto maior essas 5 métricas, melhor.
E para ver, temos que observar como as funcionalidades se distribuem dentro dos sistemas de regras de negócio. Quando se fala de arquitetura de produto (tanto físico quanto digitais), geralmente se abordam 3 grandes camadas: interface, regras de negócio e banco de dados. E embora todas sejam relevantes para uma arquitetura harmônica, é no arranjo das regras de negócio que encontramos os maiores desafios e inconsistências.
Quanto mais claro o entendimento de qual o principal sistema de regras de negócios, mais profundo e eficiente é o produto. De uma maneira geral, encontramos 6 tipos de sistemas:
- Sistemas de registro: são produtos que sua principal função é guardar informações (ex: CRM — Salesforce);
- Sistemas de trabalho: são soluções que promovem um workflow, facilitando o encadeamento das tarefas de trabalho (ex: Kanban — Trello);
- Sistemas de comunicação: são plataformas que permitem os usuários se comunicarem (ex: Slack, Whatsapp);
- Sistemas de inteligência: são produtos que permitem a análise de dados dos demais sistemas (ex: Klipfolio);
- Sistemas de transação: são soluções que permitem seus usuários venderem ou executarem algum tipo de transação (ex: meios de pagamento, ferramentas de ecommerce);
- Sistemas de integração: são produtos cuja principal função é conectar funcionalidades entre ambientes distintos (ex: APIs).
Os grandes produtos tem consistência de propósito, e portanto as funcionalidades estão agregadas ao redor de grandes temas de maneira coerente. É claro que ao longo da jornada o produto evolui e abarca vários sistemas, mas isso sempre acontece de maneira paulatina e sequencial (vide Rumo a conquista do universo).
Como se constrói um grande produto?
Todo grande produto começa com um success milestone muito claro. Sim, o tal do customer success é o ponto de partida para a construção de um grande produto. Quanto mais rápido o valor percebido pelo consumidor no uso do produto, e quanto mais guiado ele é na conquista desse e dos próximos marcos de sucesso, mais engajado ele fica.
E a partir desse success milestone, o produto avança um segundo para frente e um segundo para trás na jornada do cliente. Mas esses avanços (novas funcionalidades) geralmente estão ancorados dentro de uma arquitetura harmônica e escalável.
Os melhores produtos são desenvolvidos a partir de modelos mentais de produto, e esse modelo mental mental fica claro quando exploramos: i) a história de como o produto foi construído (de onde vieram as idéias de funcionalidades, como elas foram escolhidas, como foram desenvolvidas), ii) a velocidade de iteração (o quão rápido o produto evolui com novas funcionalidades, suas mutações e até a sua mortalidade) e iii) os processos, ferramentas e organização do time (como as coisas acontecem no dia-a-dia).
O produto perfeito não acontece por acidente. Eles nascem de playbooks consistentes, de conhecimento de causa e de muita, mas muita curiosidade. E quando se cria um grande produto ele gruda e persiste mais do que um parasita, uma bactéria, e um vírus. Qual a origem do seu produto perfeito?