Foto de Danilo Ugaddan
Uma questão que sempre trouxe discussões interessantes para nós da Astella é “o que é e quando podemos notar o Product-Market Fit em um Marketplace?”. Entendemos que o PMF para empresas SaaS geralmente ocorre nas rodadas Seed. Porém, ao conversarmos sobre o tema com os fundadores de marketplaces em nossa pesquisa, foram unânimes ao afirmar que tiveram convicção de que alcançaram PMF ao redor da Série A. Isso nos leva a concluir que, no caso dos Marketplaces, essa conquista tende a levar mais tempo.
Porque demora mais que outros modelos
Além da gestão e da construção de uma empresa de tecnologia, construir um negócio que depende de efeito de rede (Network Effect), como um marketplace, e gerenciar dois, três ou vários lados(Market Networks) de um mercado, envolve compreender dinâmicas e ferramentas como a Teoria dos Jogos, Market Design, Behavioral Economics e de Redes, entre outras, que elevam a complexidade do modelo. Por exemplo, a teoria das Mãos Invisíveis de mercado, de Adam Smith, que diz que basta colocar a oferta e demanda juntos que eles se sustentam e se equilibram, na prática, não é tão simples para as plataformas de marketplaces.
O que queremos dizer é que o sucesso de um marketplace é mais difícil de ser alcançado do que lançar um MVP para um segmento, pois a proposta de valor do produto ou plataforma depende da construção de uma rede e da sua escala. Como descrevemos anteriormente, é preciso criar estratégias para trazer oferta e demanda para a plataforma, endereçar o lado mais difícil, e encontrar a densidade mínima para construir uma rede atômica. Isso exige a gestão de diferentes propostas de valor e diferentes máquinas de vendas para múltiplos lados. Além disso, quando a plataforma não atinge a densidade satisfatória, ela cria uma experiência ruim para o usuário que ao invés de perceber a proposta de valor esperada, acaba tendo um efeito inverso, de forma detratora, ao não encontrar o que busca ou não se satisfazer com o que é oferecido na rede.
Product-Market Fit em Marketplace não é trivial. A complexidade envolvendo a satisfação de vários agentes dentro das plataformas exige mais tempo ou recursos financeiros. Muitas vezes, se faz necessário 'forjar' o mercado com subsídios para incentivar o lado difícil e criar liquidez, garantindo experiência e sucesso para compradores e vendedores e então, trazer recorrência, etc... Os fundadores entrevistados pela nossa pesquisa mencionaram que o sucesso e a construção da rede atômica de um marketplace depende da velocidade de crescimento e da escala.
Porém, quando bem arquitetado e com densidade ideal, o efeito de rede e os flywheels podem elevar o valor gerado pela plataforma para os participantes e melhorar muito os economics do negócio ao diminuir custo de aquisição, principalmente através de viralidade e boca-a-boca.
O Foco e as Experimentações em Marketplaces
Um marketplace com alta liquidez — ou seja, com uma alta probabilidade de um vendedor encontrar um comprador, ou vice-versa — é chave para a proposta de valor, portanto, é o sinal mais preponderante de product-market fit.
Product-Market fit de um marketplace depende não só do foco mas também da unidade atômica de crescimento. Nós já discutimos o conceito de Atomic Network em outros textos(aqui e aqui), mas que, para resumir, quer dizer "a menor rede necessária que pode manter-se por si só''. Isso significa que o Atomic Network precisa ter densidade e estabilidade suficientes para quebrar os primeiros efeitos anti-rede, e crescer por si só”. Alguns dos CEO e Cofundadores entrevistados também se referiram às plataformas como uma "Rede de Redes", em um conceito similar.
Ter clareza sobre o seu Atomic Network, e densidade mínima, é um primeiro passo importante.
No caso do Ifood, por exemplo, no início, o time entendia que uma rede atômica poderia ser formada intencionalmente criando sortimento mínimo de oferta de restaurantes em uma região. Eles descobriram que trazer uma hamburgueria, uma pizzaria, e um restaurante japonês para a plataforma era suficiente para atrair outros usuários e compradores e o cruzamento e ativação das bases de dados desses estabelecimentos eram capazes de criar o Atomic Network desta região.
Indicadores para medir o Product-Market Fit em Marketplaces
Os grandes indicadores que mapeamos nas pesquisas foram a liquidez e a recorrência. O primeiro demonstra que a proposta de valor está sendo atendida pela plataforma, já o segundo mostra a força do Product-Market Fit do Marketplace.
Primeiro, para ter liquidez é importante entender quais as ações core do marketplace que gera a unidade de troca de valor (ou core-action), e então acompanhar e medir o funil para a conversão dessas ações até a unidade de valor para a rede.
Por exemplo, em redes sociais como Facebook ou Linkedin o número de cadastro é seguido de um primeiro post na mesma sessão. Ou no Waze, um efeito de rede por dados, seriam as contribuições de dados pelos usuários.
Para marketplaces transacionais, alguns indicadores de ações core são:
- Search-to-fill ratio: Percentual de procura ou pedidos que resultam em uma ação de sucesso, ou até a transação.
- Time-to-fill: Tempo levado para atender o pedido da demanda.
- Utilization rate: Percentual da capacidade da rede que está sendo utilizada.
- Densidade de Supply e Buyer : A proporção de compradores para cada vendedores na rede.
Portanto, para construir uma rede que cria valor para seus participantes, é importante focar no crescimento de usuários que alcançam sucesso ou completam a ação core proposta pela plataforma.
O segundo indicador chave de Product-Market Fit é a retenção e recorrência dessas ações core. Para potencializar a rede, os usuários devem retornar e criar. Tanto métricas de Conversão do Funil como de retenção do GMV, é importante acompanhar por cohorts para entender a evolução em relação às iniciativas criadas.
Uma vez que o marketplace tem ações core de valor sendo geradas dentro da rede, e de retenção, cria um ciclo virtuoso em que proposta de valor se retroalimenta dentro da rede.