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Todo empreendedor que se preze sonha em conquistar o universo. Alguns querem fazer bem a milhares de pessoas. Outros desejam apenas que seu produto seja usado por milhares de pessoas. E tem alguns outros que sonham em milhares de pessoas fazendo fila para comprar seu último lançamento. Mas todos têm algo em comum: o desejo de conquistar o universo.
Talvez o maior desafio nessa jornada é justamente escolher o ponto de partida para a conquista. Muitos, inebriados pelas inúmeras oportunidades, tentam explorar o maior número de possibilidades ao mesmo tempo. Poucos, seja por experiência, fé, ou sorte, conseguem escolher apenas um ponto de ataque. E esses poucos são justamente os que têm a maior chance de conquistar o universo.
Muitas vezes encontramos excelentes empreendedores, perseguindo excelentes oportunidades de mercado. E na tentativa de apoiá-los na conquista do product-market-fit, o maior desafio que enfrentamos é justamente convencê-los a focar. Se o Facebook começou em Harvard, o AirBnB em Nova Iorque e o Uber em alguns CEPs de São Francisco, porquê muitos empreendedores tentam lançar seu produto no país inteiro (ou mundo inteiro)? Se os Aliados tiveram que escolher uma única praia para desembarcar na Europa e vencer o Eixo, porquê muitos ainda insistem em invadir pelo Bósforo, pela Itália, pela Espanha e por todas as praias da França ao mesmo tempo?
A verdade é que focar não é algo fácil de se fazer. Primeiro porque cognitivamente somos feitos para hedgear nossas apostas e assim aumentar nossas chances de sobrevivência. Segundo porque muitos desconhecem a história das empresas que realmente escalam. Terceiro porque tendemos a temer os competidores e achar que é melhor conquistar tudo de uma vez. Quarto, porque mesmo que eu acredite no foco, eu preciso convencer todo o meu time e as vezes investidores também. E por fim, muitas vezes não temos tempo nem dinheiro suficiente para sobreviver, e aí a única saída é vender para qualquer um que aparecer.
Para lidar com esses desafios mentais, intelectuais, emocionais e atuariais buscamos municiar os empreendedores com 4 principais artifícios: i) um mapa para a conquista da galáxia, ii) o arquétipo da célula tronco típico dessas empresas, iii) estudo de casos de empresas que escalaram, e iv) idéias de fundraising.
Mapa para a conquista da Galáxia
O simples fato de visualizarmos todo o universo teórico a ser conquistado e o segmentarmos em pedaços discretos ajuda a mente a entender a impossibilidade física de se conquistar todos os elementos ao mesmo tempo. Essa paz de espírito permite que a jornada seja compartimentalizada em blocos como Total Addressable Market (a Galáxia), Total Accessible Market (o Mundo), Total Available Market (o Continente), e o Idea Customer Profile (ICP, ou persona, o nosso primeiro castelo), e assim criar uma narrativa crível para a jornada, que invariavelmente requer o tal do foco.
Assim, busca-se conquistar o P1, ser relevante nesse segmento, e aí começar a escolher quando e como avançar para o P2, P3 e P4. A primeira pergunta que surge a partir dessa epifania é como escolher a persona ideal, ou nosso foco de ataque (P1).
O melhor modelo mental que encontramos até hoje para endereçar essa questão é o Market Development Strategy Checklist que o Geoffrey Moore oferece em Crossing the Chasm. Nesse checklist deve-se ranquear todas as possíveis hipóteses de persona (ou ICP) através dos seguintes critérios:
- Qual deles tem a maior dor: nota 5 para os que estiverem com o cabelo pegando fogo e nota 0 para os que não estiverem nem aí;
- Para qual deles o meu produto está pronto: 5 para os que eu já atendo por completo, e 0 para os que eu ainda preciso de 652 sprints para terminar o produto;
- Para qual deles eu tenho mais parceiros e aliados: 5 para aqueles cercados de empresas que se beneficiam do uso do meu produto, 0 para aqueles cercados de inimigos;
- Para qual deles eu sei vender: nota 5 para aqueles que a minha especialidade se encaixa como uma luva, 0 para aqueles que eu preciso de 2 anos para virar ninja;
- Para qual deles o meu preço se encaixa melhor: 5 para os que acham o meu produto barato, 0 para aqueles que não vê valor nem de graça;
- Para qual deles temos menos competição: 5 para aqueles que não nenhuma outra alternativa, 0 para os que são a última bolacha do pacote;
- Para qual deles em me posiciono melhor: 5 para aqueles que me reconhecem como a autoridade, 0 para os que não sabem pronunciar o nome da minha empresa;
- Qual deles me leva para a próxima adjacência: 5 para aqueles que influenciam as outras personas, 0 para os que não me levam a lugar algum.
Soma-se os pontos de cada persona e ganha a que tiver maior pontuação. É incrível a pax vobis resultante de um time todo votando em todos esses critérios e matematicamente chegando à conclusão que existe uma persona que se destaca na busca pela conquista do universo. É uma metodologia perfeita e infalível? Longe disso. Ë uma método qualitativo e apenas a mais rápida e coerente que encontramos até aqui.
Arquétipo da célula tronco
A segunda pergunta que surge, é o que exatamente significa ter foco. E aqui surge o arquétipo típico das empresas que escalam rápido e com eficiência de capital: 1 persona, 1 produto, 1 canal de venda e 1 fonte de lead.
O foco em uma persona leva ao desenvolvimento de um produto enxuto, que atende as demandas de apenas um grupo de usuários. Nesse quesito, a falta de foco resulta em produtos arquitetonicamente ineficientes, que não fazem nada maravilhosamente bem para ninguém e que consomem muito do time de desenvolvimento, já que nunca fica claro qual demanda de qual persona merece prioridade nos sprints. Temos um produto fraco com uma equipe de desenvolvimento atuando muito abaixo da sua produtividade máxima e desmoralizada.
O foco em uma persona e um produto possibilita o foco em apenas um canal de vendas. Aqui, faz toda diferença do mundo estar focado apenas em uma das principais categorias de canal de distribuição: self-service, inside sales, field sales ou channel. Aqui a falta de foco impede que o time vire ninja em alguma dessas técnicas, os vendedores ficam improdutivos porque cada venda difere da outra, e os colaterais de marketing nunca estão bom o suficiente para nenhum dos possíveis clientes.
O foco em uma persona, um produto e um canal de vendas possibilita conquistarmos o Santo Gral de toda empresa escalável: uma fonte de leads (oportunidades de venda) inesgotável e proprietária. Só o alinhamento total permite que cheguemos no ZMOT (Zero Moment of True, ou aquele momento que o consumidor percebe que tem uma dor e precisa de uma solução). Nesse caso, a falta de foco nos leva a ter todas as fontes possíveis pagas, e não dos deixa dedicar tempo e recursos para dominarmos as fontes próprias e merecidas. Mesmo na escala, as grandes empresas de tecnologia geram 80% dos seus leads de uma fonte só.
Quando mais cedo a gente consegue focar, melhor é. Quanto mais o tempo passa, mais o produto se desenvolve, mas as fontes de leads se desenvolvem, mais as relações comerciais se desenvolvem, e aí vai ficando cada vez mais difícil deixar para trás aquilo que foi conquistado. Vamos ficando pesado, diminuindo a chance de chegarmos ao product-market-fit e a grande fonte de diferenciação estratégica no longo prazo: um canal de distribuição proprietário.
Escalabilidade requer replicabilidade. A replicabilidade requer um processo. Um processo requer foco.