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Diário de um VC: eram os deuses astronautas brasileiros?

O lugar onde você nasce, os seus dotes físicos e a escola onde você estudou, podem significar tudo na jornada da sua vida. Empreendedores no Vale, por exemplo, tem 10x mais chance de dar certo do que seus pares por aqui. Mas nada na vida é determinado e imutável. Uma coisa é entender o tamanho do desafio quando não se parte de um ponto privilegiado, o outro é se entregar e não se dedicar a tentar conquistar o universo a partir do Brasil. Uma coisa é usar a inferioridade como energia propulsora, a outra é deixar o complexo de inferioridade destruir a nossa coragem de tentar.
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Diário de um VC: eram os deuses astronautas brasileiros?
Diário de um VC: eram os deuses astronautas brasileiros?

Sorte é tudo na vida.

O lugar onde você nasce, os seus dotes físicos e a escola onde você estudou, podem significar tudo na jornada da sua vida. Empreendedores no Vale, por exemplo, tem 10x mais chance de dar certo do que seus pares por aqui. Mas nada na vida é determinado e imutável. Uma coisa é entender o tamanho do desafio quando não se parte de um ponto privilegiado, o outro é se entregar e não se dedicar a tentar conquistar o universo a partir do Brasil. Uma coisa é usar a inferioridade como energia propulsora, a outra é deixar o complexo de inferioridade destruir a nossa coragem de tentar.

Complexo de inferioridade tal que nos faz desenvolver e aceitar o complexo do copy-cat, que determina que por aqui só se fazem coisas copiadas. O que muitos esquecem é que Alemanha, Japão, China e os Tigres Asiáticos, foram, em diferentes fases de suas histórias, nações copy-cats, até se tornarem proficientes o suficiente para atacar seus competidores globais.

Pode parecer contraintuitivo, mas o antropólogo Jared Diamond explica em Armas, Germes e Aço que algumas sociedades se desenvolvem mais do que outras justamente a partir da escassez e não da abundância, pois é a primeira que provoca o instinto inovador.

E é justamente nesse ponto de inflexão que se encontra o Brasil: proficiente para começar a atacar seus competidores digitais globais-temos mercado, temos talento, temos investidores, temos cases de sucesso, e sim, habemus playbook de crescimento global!

Realidade #1: O Brasil desponta entre os 5 principais mercados das principais empresas digitais globais — Dropbox, Airbnb, Instagram, Whatsapp, Uber, Zoom, Pipedrive, entre muitos outros, tem o Brasil como um dos seus principais mercados. A pergunta que fica é porque essas empresas de consumo, marketplace e SaaS para PMEs não nasceram no Brasil?

Realidade #2: O Brasil já é um polo de talentos globais, com uma safra de empreendedores na sua 2nd ou 3ra jornada — Os fundadores e principais talentos de 99taxis, MinhaVida, iCarros, GetNet, Printi, Movile e muitas outras empresas digitais de sucesso (várias delas unicórnios) já terminaram o seu primeiro ciclo, e já fundaram e investiram em novas empresas. Isso quer dizer que temos uma safra mais talentosa, mais experiente e muito mais ambiciosa. E ao contrário do que o Doug Leone diz (Porque a Sequoia investe pouco no Brasil), não faltam engenheiros de software no Brasil. Faltam sim product managers e uma cultura de produto. Mas isso, essa nova safra de serial founders já está endereçando.

Realidade #3: O Brasil conta com dinheiro e investidores de reputação global — Kaszek, monashees, Redpoint eVentures, DGF, Valor, Canary (e porque não Astella :)) já são reconhecidos globalmente como fundos de VC de primeira linha. Inúmeros anjos, fundos como Bossa Nova, grupos de anjos e aceleradoras irrigam o início da jornada. Novos fundos como Iporanga, Barn e Maya Capital já brigam pela atenção dos empreendedores. Fundos setoriais como Performa e SP Ventures dominam segmentos de mercado. Inúmeras iniciativas de Corporate Ventures arregassam as mangas. Vários fundos internacionais caçam oportunidades late-stage. Dinheiro não falta.

Realidade #4: O Brasil já tem casos de sucesso na conquista de mercados internacionais — Pipefy, Resultados Digitais, Hotmart, Gympass, entre outros, já provaram que é possível se lançarem ao universo a partir do Brasil. Ou seja, é possível. Ou melhor, já é provável!

Realidade #5: existem playbooks para ataque global que essas scaleups estão seguindo. Sem ser simplista, é preciso iniciar dando dois grandes passos: i) ter a atitude certa e ii) escolher o gatilho certo.

i) Ter a atitude certa

Segundo o estudo Globalization Patterns of Emerging High Technology Companies, um dos principais fatores determinantes para a globalização é a atitude dos fundadores da empresa em relação ao mercado global. Geralmente essa atitude de que é possível internacionalizar advém da experiência prévia desses fundadores, seja porque tenham trabalhado em uma empresa global, ou porque tenham vivido em outros países. Essa atitude transparece de maneira prática:

  • No momento em que a startup inicia as atividades de globalização (primeiro e segundo ano de vida da empresa);
  • Na missão da empresa, que leva um tom de um problema global;
  • Na preparação do backbone do produto (código, UX e pagamentos) para essa atividade;
  • No grau de internacionalização (leia-se inglês) dos colaterais de venda da empresa (ex: site, aplicativo, reviews em sites setoriais especializados, etc.), para que ela seja facilmente descoberta por potenciais clientes e parceiros internacionais;
  • No saber transmitir credibilidade na história de internacionalização (foco no hoje com alto potencial de adjacências no futuro próximo);
  • Na percepção do melhor gatilho de internacionalização.

ii) Escolher o gatilho certo

A maneira como as empresas se internacionalizam tendem a estar relacionada ao modelo de negócio e ao tipo de persona que a empresa serve:

  • Domestic Customer Pull: startups que servem grandes empresas geralmente são levadas a outros mercados por seus clientes, que operam em diversos países. Empresas como ServiceNow e Eloqua, que tem um tíquete médio alto foram “puxadas” para mercado internacionais, por seus principais clientes, que preferem usar o seu fornecedor doméstico em operações ao redor do mundo;
  • Distribution Partner Pull: empresas que usam canais de representação (VARs ou Value Added Resellers) que atuam em diversas regiões do mundo tendem a ser levadas por esses parceiros para novas aventuras além-mar. A Parallels é um excelente caso de empresa que se tornau global sendo ciceroneada por seus VARs (grandes empresas de telecom). Essa dinâmica é cada vez mais comum para empresas que estão conectadas a grandes hubs de APIs como o Force.com, ou aplicativos de celular que recebem apoio da Apple ou Android para traduzirem e internacionalizarem a sua oferta de conteúdo
  • Overseas Customer Pull: essas empresas são demandadas por clientes de diversos lugares do mundo, e tipicamente são empresas calcadas em PLG (product led growth), facilmente descobertas através do seu site em inglês ou por dinâmicas de viralização de uso. Esse é o modelo típico da internacionalização de empresas de audiência (Facebook, Twitter); de plataforma (Atlassian, Github), e SaaS SMEs (SurveyMonkey, Pipedrive, Dropbox);
  • Proactive Internal Push: típica de empresas marketplaces (Uber, Airbnb) que usam times internos de expansão a partir de um playbook de crescimento de bairro por bairro, cidade por cidade, país por país.

Se você ainda acha remota a chance da sua startup conquistar o mundo e o universo, eu te convido a parar tudo o que você está fazendo. Leia tudo o que puder sobre o Hedgehog Concept e The Dip, comece tudo de novo, e volte aqui quando achar pelo menos possível essa missão.

E na verdade, sorte não é tudo, é apenas uma parte da vida. O resto, depende do seu talento.

Para aprofundar no tema:

  1. Expanding into US and Europe — Index Ventures
  2. Building the global startup — A16Z
  3. Expand into international markets — Balderton Capital
  4. Think Local, Act Global: Marketing Strategies for Expanding Your Startup Around the World
  5. When And How To Pick Your Next Launch Country
  6. Dropbox International expansion
  7. Lesson in global expansion from Atlassian
  8. Hubspot Global Marketing Playbook

Edson Rigonatti

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Edson Rigonatti

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